terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Semana Cáritas, 17 a 24 de Fevereiro 2008


Acolher a diversidade exige a educação do olhar.


Desempregados jovens e de longa duração, idosos sem família e menores abandonados, pessoas com deficiência e com sida, cidadãos ciganos e sem abrigo, pessoas drogadas e prostituídas, trabalhadores imigrantes e emigrantes, refugiados e estudantes estrangeiros, reclusos e pessoas discriminadas.... Com eles e ao serviço deles a Caritas Portuguesa unida às Caritas diocesanas e a outros organismos da Igreja e da sociedade em geral, quer continuar a ser – não obstante a diminuição dos meios e recursos - sinal vivo e orgânico do Amor sem limites e diversificado de Deus pela humanidade inteira.
Os empobrecidos pelo nosso moderno “estilo de vida nacional” - sempre menos sóbrio, poupado e simples - pululam a olhos vistos nas nossas cidades e vilas. Esses nossos irmãos e irmãs, em situação de vulnerabilidade, são denúncia pública de um sistema económico, laboral e político que, por mais europeu e rico que se queira proclamar ao mundo, se apresenta sempre mais exclusivista, selectivo, competitivo e desigual.
Neste ano europeu do diálogo intercultural considero que é preciso educar o olhar! A nível da acção social da Igreja urge uma nova pedagogia do olhar desde as famílias, passando pelas nossas comunidades cristãs para chegar às escolas e autarquias. A caridade cristã também depende do olhar! Reconheço que não nos sabemos olhar uns aos outros com o mesmo olhar com que Deus sempre olhou para a humanidade. Ele é o Deus que não faz acepção de pessoas (Gal 2, 6). O seu olhar não discrimina ninguém! Ele é o Deus que sempre acolhe no seu seio trinitário a diversidade e que, não obstante as diferentes formas como ainda é olhado na história humana – algumas vezes de forma ainda muito injusta e ingrata -, Ele nunca altera o seu olhar magnânimo de bondade, solidariedade e libertação.
O olhar de Deus reabilita, admiravelmente, o homem ferido pelo mal, sara as feridas causadas pelas estruturas de pecado e envia-o rumo ao desconhecido: ao outro que pede acolhimento e reconhecimento para se viver a vida com sentido. Já no passado ano europeu, dedicado à igualdade de oportunidades para todos, verificámos, lamentavelmente, que persistem muitas “carências de olhar” a nível da efectivação da igualdade de tratamento, da igualdade de género e de acesso aos meios de auto-promoção e apoio social. O próprio olhar de alguns, com responsabilidades na sociedade portuguesa, para com a presença da Igreja nas instituições sociais e educativas parece estar em mudança com o argumento pouco consistente de uma nova “laicidade da caridade” que corre o risco grave de tornar-se numa ofensa à tradição das obras de misericórdia cristã tão enraizadas na nossa lusa cultura.
Vamos abrir as portas à igualdade! Vamos ser fiéis à “ética do olhar” que não discrimina, mas que a todos escuta, acolhe e auxilia com inteligência. Vamos lutar contra as portas que parecem fechar-se silenciosamente que, ao proclamarem a supremacia da ciência, da técnica, da gestão e do tecnicismo correm o risco grave de deixar na rua, no desespero, longe dos apoios legítimos, ao frio e à fome, muitos cidadãos portugueses e estrangeiros que não têm outra saída se não recorrer à flexibilidade da caridade praticada por tantas organizações da sociedade civil, entre as quais se contam estruturas de inspiração cristã, animadas por voluntários e assalariados que com cosciência cívica e de baptizados desenvolvem a sua acção social com profundo sentido de serviço aos outros.
É, sobretudo, a nós cristãos leigos que a Igreja confia, em fidelidade ao príncipio da subsidiaridade, a aplicação prática e adequada dos princípios de reflexão, critérios de julgamento e directrizes de acção próprias da Doutrina Social da Igreja. E porque advertimos desconhecimento e ignorância relativamente a esta doutrina, continuamos empenhados na divulgação da mesma, através de tantos modos, nas comunidades cristãs.
Aproveitando o tempo de Quaresma, e motivando as muitas iniciativas de solidariedade que, durante a Semana Nacional da Cáritas sob o lema Acolhe a Diversidade - Abre portas à Igualdade, irão acontecer por todo o país, quero manifestar o meu agradecimento a todos os que com a sua generosidade, tempo, ousadia e competência, em estruturas públicas e privadas, são parceiros da Caritas e connosco têm tornado possível a presença de Portugal em projectos humanitários de socorro às vítimas de muitas catástrofes naturais e humanas, bem como em programas de apoio ao progresso social e económico de países em vias de desenvolvimento, particularmente os de expressão portuguesa.
Obrigado! Continuemos a abrir portas à igualdade na diversidade de olhares!

Eugénio José da Cruz Fonseca, Presidente da Cáritas Portuguesa

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Determinado em propor mudanças


Em Vila Real, D. Amândio Tomás quer rever métodos pastorais, apostar na formação, propor aos padres menos missas de afogadilho e aos leigos menos sacramentos recebidos com leviandade.



D. Amândio Tomás iniciou o seu ministério episcopal em Vila Real e quer propor mais catequese e travar uma religiosidade assente apenas na prática sacramental, sobretudo quando ela tem motivações sociais. Para travar é também a “hemorragia” dos transmontanos para as cidades do litoral, o que pressupõe a criação de condições que permitam vida economicamente estável no interior.
Na celebração de acolhimento do Bispo Coadjutor da Diocese de Vila Real, conheceram-se as determinações de quem voltou à sua terra. “Voltei para anunciar Cristo”, referiu D. Amândio Tomás às centenas de transmontanos que acolheram com orgulho um Bispo transmontano, saudando-o ao longo do cortejo entre o Governo Civil da cidade e a Sé da Diocese que antecedeu a Eucaristia de início de ministério, neste Domingo. Às dezenas de sacerdotes e leigos que ouviram expôs, na homilia da missa, um conjunto de ideias para a dinamização de todos os católicos na região.
Ponto de honra para o ministério do Bispo Coadjutor é tudo fazer de acordo com aquele que é o Bispo Diocesano, D. Joaquim Gonçalves. “Tudo farei com o meu bispo e nada contra ele”. Parceiro no ministério episcopal em Vila Real, D. Amândio quer contar com a proximidade e orientação de D. Joaquim, agora em recuperação do transplante cardíaco a que foi submetido. “Ajudai-me a ajudar o nosso bispo. Nós precisamos muito dele, do seu conselho, da sua experiência”, referiu.
Nesta Diocese, D. Amândio está determinado em revestir a prática das comunidades cristãs de convicções profundas. Para isso, disse ser preciso apostar na catequese, revendo métodos de coordenação e animação pastoral na Diocese. A todos, sacerdotes e leigos, D. Amândio pede que “não se deixem intimidar pelas ameaças do laicismo e do relativismo”, reagindo a uma cultura que quer calar Cristo e os valores irrenunciáveis do cristianismo, como o valor da vida, da dignidade humana e do bem comum. “Sonho com cristãos comprometidos a animar a vida pública e a transformar por dentro a sociedade como locomotivas que arrastam, que contagiam, que galvanizam, opondo-se ao marasmo, à cobardia ao medo e à apostasia da fé”, referiu.
Menos missas de “afogadilho”
Para dinamizar a Igreja na Diocese, D. Amândio Tomás sugere “trabalho em rede”, a envolver padres, religiosos, movimentos. “Não sejais preguiçosos na vossa dedicação”, pediu o Bispo Coadjutor da Diocese, apostado em promover trabalhos de conjunto e não no isolamento de cada “quintal”.
O trabalho pastoral dos padres da Diocese mereceu conselhos muito claros do Bispo que chegava a Vila Real: “mais catequese”, “menos sacramentos recebidos sem convicções” e “menos missas de afogadilho”.
“Devemos apostar em menos missas de afogadilho, umas atrás das outras, para cumprir um programa, e mais catequese, sem contudo desprezar a eucaristia que é o coração da Igreja, que é fonte e ápice da sua actividade”.
D. Amândio Tomás referia-se à necessidade de preparação dos sacramentos que merecem maior visibilidade social, nomeadamente o baptismo e o crisma e o matrimónio, e à grande sobrecarga que afecta os padres e outros ministros ordenados diante das solicitações dos muitos “serviços religiosos”. Para D. Amândio, é necessário “mudar de estratégia pastoral. Não podemos multiplicar missas e sacramentos”. Na homilia da missa, repetiu a necessidade de “mais catequese e de mais formação de pessoas e de consciências e de menos sacramentos recebidos com leviandade, a cumprir programas, sem convicções, recebidos por motivos fúteis”.
Contra o despovoamento
Às preocupações eclesiais, D. Amândio acrescenta as sociais e económicas, nomeadamente as que motivam o constante despovoamento daquela região transmontana, que “é de todo o interior de Portugal”, como constatou em declarações à comunicação social.
Diante da “hemorragia de gente que vai para o litoral”, o Bispo Coadjutor de Vila Real afirma a necessidade extrema de “fixar as populações, de criar as possibilidade para as pessoas não emigrarem”. Convicto de que as pessoas não vão para o litoral por “mero prazer”, D. Amândio Tomás afirma a necessidade de combater as razões económicas que levam os transmontanos a emigrarem, criando condições económicas que façam com que “as pessoas tenham possibilidades de viver aqui condignamente.
O Bispo de Vila Real
D. Joaquim Gonçalves é Bispo em Vila Real há 20 anos. Primeiro como Coadjutor e, desde 1991, como Bispo Diocesano.
Na noite do dia 12 para o dia 13 de Janeiro foi submetido a um transplante cardíaco, no Hospital Universitário de Coimbra. O Bispo da Diocese transmontana fora internado, no dia 16 de Outubro de 2007, no Hospital Santos Silva, em Vila Nova de Gaia, onde se sentiu mal durante uma consulta. Posteriormente foi transferido para Coimbra.
A sua saúde fez com que pedisse ao Papa Bento XVI um Bispo para o ajudar no trabalho de animação pastoral da Diocese, tendo sido rápida a nomeação de D. Amândio Tomás para Bispo Coadjutor.
Na mensagem que dirigiu à Diocese para este dia, D. Joaquim Gonçalves pediu uma recepção “em festa” àquele que será o Bispo de Vila Real “daqui a algum tempo”. É a convicção do Bispo que garantiu, na mensagem lida no início da celebração de início de ministério do seu Coadjutor, estar a recuperar bem do transplante cardíaco a que foi submetido.
Bispo Coadjutor
Na maioria dos casos, é uma necessidade especial – muitas vezes problemas de saúde - que exige que se dê ao Bispo diocesano um Bispo Coadjutor para o ajudar. O Bispo coadjutor é nomeado por iniciativa da Santa Sé e, ao contrário dos Bispos auxiliares, goza do direito de suceder ao Bispo diocesano quando este cessa as suas funções.
“Vagando a sé episcopal, o Bispo coadjutor torna-se imediatamente Bispo da diocese para a qual fora constituído”, refere o cânone 409 do Código de Direito Canónico (CDC).
O decreto Christus Dominus, do Concílio Vaticano II, sobre a missão pastoral dos Bispos na Igreja refere que “o Bispo Coadjutor, isto é, aquele que é nomeado com direito de sucessão, sempre há-de ser constituído Vigário Geral pelo Bispo diocesano”. Em casos particulares, a autoridade competente poderá conceder-lhe faculdades mais amplas.
FOTO: Mensageiro Notícias
Paulo Rocha 11/02/2008

Um Bispo para a Comunhão
Homilia de D. Jorge Ortiga na entrada em Vila Real de D. Amândio Tomás
Vive a Diocese de Vila Real, em ambiente festivo, não tanto a Tomada de Posse dum Bispo Coadjutor, já realizada pelo Colégio de Consultores, mas de apresentação Solene e de início de missão Episcopal de D. Amândio José Tomás. A apresentação torna-se desnecessária sendo um cristão nascido nesta comunidade e mais tarde acolhido no presbitério que a serve. Trata-se dum regresso com um programa a exercer dum modo eclesial muito característico. Quanto ao Programa teremos a graça de o ouvir na homilia e, particularmente, de o acolher com renovado entusiasmo e ardor empenhativo no quotidiano da vida das comunidades. Sinto-me feliz por introduzir esta celebração testemunhando-lhe a minha comunhão efectiva e afectiva, como Metropolita e Presidente da C.E.P.. Aproveito para, à guisa de introdução sublinhar um pensamento sobre o ministério episcopal.
Sirvo-me de palavras da Pastores Gregis sobre o Bispo, servidor do Evangelho de Jesus Cristo para a Esperança do mundo.
“A Igreja é comunhão orgânica que se realiza através da coordenação dos vários carismas, ministérios e serviços em ordem à consecução do fim comum que é a salvação. O Bispo é responsável pela realização desta unidade na diversidade, procurando favorecer de tal modo a sinergia entre os diversos agentes para que seja possível percorrerem juntos o caminho comum de fé e de missão” (P.G. 44).
Sim, percorremos juntos um caminho comum de fé e de missão. Daí que se imponha trazer para esta celebração a pessoa do Senhor D. Joaquim Gonçalves evocando-o como Bispo desta Diocese mas, sobretudo, como Pastor que sabe dar a vida pelas suas ovelhas como tem demonstrado neste momento particularmente delicado onde a força e confiança na ciência dos homens não dispensa um testemunho eloquente de entrega nas mãos de Deus. Que o Senhor lhe conceda o dom duma saúde capaz de continuar a servir este povo no anúncio e serviço do Evangelho. Dando graças a Deus por quanto a medicina nele realizou, intensifiquemos a nossa comunhão de oração para que regresse rapidamente para o meio do Povo com quem tão bem soube identificar-se.
O Bispo Coadjutor D. Amândio irá percorrer com ele o mesmo caminho de fé e de missão. Na fé dum reconhecimento de Deus que, em Jesus Cristo, se fez pobre para nos enriquecer pela sua pobreza (Conf. 2 Cor. 8, 9), entregando-se totalmente por nós. Com o D. Amândio, renovando a nossa fé neste Deus amor estamos a assumir a comum missão, aprendendo com Cristo a fazer da nossa vida um dom total”.
Estas palavras colocam-nos em comunhão com o Papa, no significado do seu ministério petrino e acolhendo o projecto traçado por ele para a Quaresma, que nos introduz no essencial cristão: acolher o dom do Amor de Deus para o tornar visível num mundo ávido de algo que ainda não encontrou. Este amor torna possível a “unidade na diversidade” que, acompanhando o D. Amâmdio no início do serviço episcopal nesta diocese, me atrevo a referir.
Unidade do Bispo Diocesano com o seu Coadjutor, destes com o restante colégio episcopal e quero recordar o D. António Marto que amanhã completa 7 anos de ordenação episcopal, e, particularmente, com um povo sacerdotal onde o presbitério emerge como família e os cristãos leigos crescem no discernir as razões da sua esperança, através duma formação persistente, e sabem articular os seus dons e talentos num serviço comunitário aberto e comprometido em dar respostas aos reais problemas dum povo por quem Cristo se entregou.
Sabemos que “Ubi episcopus, ibi ecclesia” (onde está o Bispo, aí está a Igreja). Isto não significa autoritarismo ou centralismo eclesial. Vale como interpelação permanente para um trabalhar com o Bispo, na unidade expressa nas cordas duma citara, onde cada um é imprescindível mas consciente de que só se torna harmonia interpelativa se se transcende nesta integração coral onde de muitos se forma um só corpo.
Este “regresso” de D. Amândio à sua Diocese para exercer um ministério de comunhão com o Senhor D. Joaquim é mais um dom de Deus a esta comunidade mas, simultaneamente, é, peço desculpa por o sublinhar, um momento de compromisso de todos para que a mensagem de Cristo encontre adesão pessoal em todos os cristãos desta Diocese. Entregando-lhe o báculo, sei que a diocese poderá contar com um “Servo por amor” e acredito que todos se irão empenhar para manifestar a Beleza de Deus ao mundo.
Vamos rezar para que isso aconteça e, como Igreja, testemunhemos, em comunhão orgânica o tipo de cristianismo em que acreditamos e o modelo de Igreja que queremos edificar.
10-02-2008
† Jorge Ortiga

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Quaresma de 2008



Mensagem de Bento XVI para a Quaresma de 2008
«Cristo fez-Se pobre por vós»

Queridos irmãos e irmãs!
1. Todos os anos, a Quaresma oferece-nos uma providencial ocasião para aprofundar o sentido e o valor do nosso ser de cristãos, e estimula-nos a redescobrir a misericórdia de Deus a fim de nos tornarmos, por nossa vez, mais misericordiosos para com os irmãos. No tempo quaresmal, a Igreja tem o cuidado de propor alguns compromissos específicos que ajudem, concretamente, os fiéis neste processo de renovação interior: tais são a oração, o jejum e a esmola. Este ano, na habitual Mensagem quaresmal, desejo deter-me sobre a prática da esmola, que representa uma forma concreta de socorrer quem se encontra em necessidade e, ao mesmo tempo, uma prática ascética para se libertar da afeição aos bens terrenos. Jesus declara, de maneira peremptória, quão forte é a atracção das riquezas materiais e como deve ser clara a nossa decisão de não as idolatrar, quando afirma: «Não podeis servir a Deus e ao dinheiro» (Lc 16, 13). A esmola ajuda-nos a vencer esta incessante tentação, educando-nos para ir ao encontro das necessidades do próximo e partilhar com os outros aquilo que, por bondade divina, possuímos. Tal é a finalidade das colectas especiais para os pobres, que são promovidas em muitas partes do mundo durante a Quaresma. Desta forma, a purificação interior é corroborada por um gesto de comunhão eclesial, como acontecia já na Igreja primitiva. São Paulo fala disto mesmo quando, nas suas Cartas, se refere à colecta para a comunidade de Jerusalém (cf. 2 Cor 8-9; Rm 15, 25-27).
2. Segundo o ensinamento evangélico, não somos proprietários mas administradores dos bens que possuímos: assim, estes não devem ser considerados propriedade exclusiva, mas meios através dos quais o Senhor chama cada um de nós a fazer-se intermediário da sua providência junto do próximo. Como recorda o Catecismo da Igreja Católica, os bens materiais possuem um valor social, exigido pelo princípio do seu destino universal (cf. n. 2403).
É evidente, no Evangelho, a admoestação que Jesus faz a quem possui e usa só para si as riquezas terrenas. À vista das multidões carentes de tudo, que passam fome, adquirem o tom de forte reprovação estas palavras de São João: «Aquele que tiver bens deste mundo e vir o seu irmão sofrer necessidade, mas lhe fechar o seu coração, como pode estar nele o amor de Deus?» (1 Jo 3, 17). Entretanto, este apelo à partilha ressoa, com maior eloquência, nos Países cuja população é composta, na sua maioria, por cristãos, porque é ainda mais grave a sua responsabilidade face às multidões que penam na indigência e no abandono. Socorrê-las é um dever de justiça, ainda antes de ser um gesto de caridade.
3. O Evangelho ressalta uma característica típica da esmola cristã: deve ficar escondida. «Que a tua mão esquerda não saiba o que fez a direita», diz Jesus, «a fim de que a tua esmola permaneça em segredo» (Mt 6, 3-4). E, pouco antes, tinha dito que não devemos vangloriar-nos das nossas boas acções, para não corrermos o risco de ficar privados da recompensa celeste (cf. Mt 6, 1-2). A preocupação do discípulo é que tudo seja para a maior glória de Deus. Jesus admoesta: «Brilhe a vossa luz diante dos homens de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem vosso Pai que está nos Céus» (Mt 5, 16). Portanto, tudo deve ser realizado para glória de Deus, e não nossa. Queridos irmãos e irmãs, que esta consciência acompanhe cada gesto de ajuda ao próximo evitando que se transforme num meio nos pormos em destaque. Se, ao praticarmos uma boa acção, não tivermos como finalidade a glória de Deus e o verdadeiro bem dos irmãos, mas visarmos antes uma compensação de interesse pessoal ou simplesmente de louvor, colocamo-nos fora da lógica evangélica. Na moderna sociedade da imagem, é preciso redobrar de atenção, dado que esta tentação é frequente. A esmola evangélica não é simples filantropia: trata-se antes de uma expressão concreta da caridade, virtude teologal que exige a conversão interior ao amor de Deus e dos irmãos, à imitação de Jesus Cristo, que, ao morrer na cruz, Se entregou totalmente por nós. Como não agradecer a Deus por tantas pessoas que no silêncio, longe dos reflectores da sociedade mediática, realizam com este espírito generosas acções de apoio ao próximo em dificuldade? De pouco serve dar os próprios bens aos outros, se o coração se ensoberbece com isso: tal é o motivo por que não procura um reconhecimento humano para as obras de misericórdia realizadas quem sabe que Deus «vê no segredo» e no segredo recompensará.
4. Convidando-nos a ver a esmola com um olhar mais profundo que transcenda a dimensão meramente material, a Escritura ensina-nos que há mais alegria em dar do que em receber (cf. Act 20, 35). Quando agimos com amor, exprimimos a verdade do nosso ser: de facto, fomos criados a fim de vivermos não para nós próprios, mas para Deus e para os irmãos (cf. 2 Cor 5, 15). Todas as vezes que por amor de Deus partilhamos os nossos bens com o próximo necessitado, experimentamos que a plenitude de vida provém do amor e tudo nos retorna como bênção sob forma de paz, satisfação interior e alegria. O Pai celeste recompensa as nossas esmolas com a sua alegria. Mais ainda: São Pedro cita, entre os frutos espirituais da esmola, o perdão dos pecados. «A caridade – escreve ele – cobre a multidão dos pecados» (1 Pd 4, 8). Como se repete com frequência na liturgia quaresmal, Deus oferece-nos, a nós pecadores, a possibilidade de sermos perdoados. O facto de partilhar com os pobres o que possuímos, predispõe-nos para recebermos tal dom. Penso, neste momento, em quantos experimentam o peso do mal praticado e, por isso mesmo, se sentem longe de Deus, receosos e quase incapazes de recorrer a Ele. A esmola, aproximando-nos dos outros, aproxima-nos de Deus também e pode tornar-se instrumento de autêntica conversão e reconciliação com Ele e com os irmãos.
5. A esmola educa para a generosidade do amor. São José Bento Cottolengo costumava recomendar: «Nunca conteis as moedas que dais, porque eu sempre digo: se ao dar a esmola a mão esquerda não há de saber o que faz a direita, também a direita não deve saber ela mesma o que faz » (Detti e pensieri, Edilibri, n. 201). A este propósito, é muito significativo o episódio evangélico da viúva que, da sua pobreza, lança no tesouro do templo «tudo o que tinha para viver» (Mc 12, 44). A sua pequena e insignificante moeda tornou-se um símbolo eloquente: esta viúva dá a Deus não o supérfluo, não tanto o que tem como sobretudo aquilo que é; entrega-se totalmente a si mesma.
Este episódio comovedor está inserido na descrição dos dias que precedem imediatamente a paixão e morte de Jesus, o Qual, como observa São Paulo, fez-Se pobre para nos enriquecer pela sua pobreza (cf. 2 Cor 8, 9); entregou-Se totalmente por nós. A Quaresma, nomeadamente através da prática da esmola, impele-nos a seguir o seu exemplo. Na sua escola, podemos aprender a fazer da nossa vida um dom total; imitando-O, conseguimos tornar-nos disponíveis para dar não tanto algo do que possuímos, mas darmo-nos a nós próprios. Não se resume porventura todo o Evangelho no único mandamento da caridade? A prática quaresmal da esmola torna-se, portanto, um meio para aprofundar a nossa vocação cristã. Quando se oferece gratuitamente a si mesmo, o cristão testemunha que não é a riqueza material que dita as leis da existência, mas o amor. Deste modo, o que dá valor à esmola é o amor, que inspira formas diversas de doação, segundo as possibilidades e as condições de cada um.
6. Queridos irmãos e irmãs, a Quaresma convida-nos a «treinar-nos» espiritualmente, nomeadamente através da prática da esmola, para crescermos na caridade e nos pobres reconhecermos o próprio Cristo. Nos Actos dos Apóstolos, conta-se que o apóstolo Pedro disse ao coxo que pedia esmola à porta do templo: «Não tenho ouro nem prata, mas vou dar-te o que tenho: Em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda» (Act 3, 6). Com a esmola, oferecemos algo de material, sinal do dom maior que podemos oferecer aos outros com o anúncio e o testemunho de Cristo, em cujo nome temos a vida verdadeira. Que este período se caracterize, portanto, por um esforço pessoal e comunitário de adesão a Cristo para sermos testemunhas do seu amor. Maria, Mãe e Serva fiel do Senhor, ajude os crentes a regerem o «combate espiritual» da Quaresma armados com a oração, o jejum e a prática da esmola, para chegarem às celebrações das Festas Pascais renovados no espírito. Com estes votos, de bom grado concedo a todos a Bênção Apostólica.

Vaticano, 30 de Outubro de 2007.

BENEDICTUS PP. XVI



Mensagem do Cardeal D. José Policarpo para a Quaresma de 2008


1. O Santo Padre Bento XVI dirigiu a toda a Igreja a sua Mensagem para esta Quaresma. Compete-me a mim concretizá-la para a Igreja de Lisboa, tendo em conta as suas características, dinamismos e fragilidades, anseios e dificuldades, no contexto das opções prioritárias da nossa acção pastoral.
O desafio global que cada Quaresma nos apresenta é assim enunciado pelo Santo Padre: “A Quaresma oferece-nos uma providencial ocasião para aprofundar o sentido e o valor da nossa identidade de cristãos, e estimula-nos a redescobrir a misericórdia de Deus, a fim de nos tornarmos, por nossa vez, mais misericordiosos para com os irmãos”.
Este desafio com que abre a sua Mensagem completa-o nas palavras com que a encerra: “Que este período se caracterize, portanto, por um esforço pessoal e comunitário de adesão a Cristo para sermos testemunhas do seu amor”.
Este é o objectivo único de toda a acção pastoral orientada para o crescimento da Igreja, Povo do Senhor: converter-nos a Jesus Cristo, segui-l’O como discípulos, abrir-nos ao amor que Ele nos comunica e que conduzirá toda a nossa vida. Esta é a função da “iniciação cristã”, que alarga o horizonte da inteligência e do coração para aderirmos mais radicalmente a Jesus Cristo, à vida que Ele nos oferece, aos caminhos de fidelidade que Ele nos sugere. A nossa Igreja diocesana tem de insistir neste caminho da “iniciação cristã” para todos os baptizados, através da catequese, da Palavra de Deus, da celebração dos sacramentos e sua preparação, de modo particular aqueles que, por serem basilares, a Igreja chama “sacramentos da iniciação cristã”: o Baptismo, a Confirmação, a Eucaristia.
Independentemente dos grupos em que estamos inseridos e dos processos em que participamos, a Quaresma pode ser, para cada cristão, em Igreja, um tempo de aprofundamento deste essencial cristão, para que a Igreja seja, cada vez mais, um Povo de discípulos de Jesus.
Esta caminhada pessoal é feita em Igreja e através dos meios que esta nos oferece. Mas pode e deve ter a verdade e a autenticidade da nossa vida pessoal. Quero indicar a todos, como atitudes fundamentais a aprofundar, a conversão e o cultivo da fé, da esperança e da caridade.
A Conversão
2. A realidade do pecado tem vindo a ser relativizada na consciência dos cristãos e na cultura que nos envolve, o que diminui o sentido da necessidade e da urgência da conversão. Trata-se de uma ilusão perigosa: não vencer o pecado no nosso coração, impede verdadeiramente que o abramos para novos horizontes do sentido da vida, da felicidade, do amor e da verdade fundamental da nossa relação com Deus: glorificá-l’O e amá-l’O sobre todas as coisas, para podermos rezar com verdade a oração que o Senhor nos ensinou: “seja feita a Vossa vontade, assim na Terra como no Céu”.
O pecado é manifestação da autonomia do homem em relação a Deus, autonomia da nossa vontade, da nossa liberdade, do discernimento que fazemos das diversas realidades que temos de enfrentar. Porque não vive a sua vida em relação com Deus, o homem decide-a como se Deus não tivesse nada a ver com ela. Podemos dizer que acreditamos em Deus, mas não estamos dispostos a viver com Ele em todos os momentos da nossa vida, escutando-O, contando com a força do Seu amor, louvando-O, procurando sintonizar a nossa vontade com a d’Ele.
É por isso que a conversão é, antes de mais, uma conversão a Deus e ao Seu Filho Jesus Cristo: “Convertei-vos ao Senhor vosso Deus”. Significa uma abertura do coração à presença e acção de Deus na nossa vida, que influencia tudo e marca um ritmo novo. É um caminho que supõe coragem e decisão, humildade e obediência ao Espírito, purificação da vontade e dos desejos, para que o principal desejo da nossa vida seja o desejo de Deus e do Seu amor.
Esta Quaresma é ocasião para, cada um de nós, avaliar a realidade do pecado na sua vida, e encetar o caminho da conversão, do regresso a Deus.
A Fé
3. A fé é a atitude decisiva e constitutiva da existência cristã: quando ela falha ou enfraquece, tudo falha ou se relativiza. É uma atitude do coração, que envolve a inteligência e a vontade, que se abandona totalmente, na confiança, a Deus que Se nos manifestou. Foi por isso que, desde o início do cristianismo, homens e mulheres mudaram radicalmente a sua vida, deixaram tudo e seguiram Jesus.
No centro desta atitude está a presença irrecusável do Deus vivo, através do Seu Filho Jesus Cristo. Antes de ser um programa de vida, a fé é uma obediência de amor. “A Deus que Se nos revela é devida a obediência da fé”, diz o Concílio (cf. Dei Verbum, nº 5). A fé é a principal atitude que Deus nos pede e é, na sua génese, um acto de adoração de Deus.
Nesta Quaresma, devemos escutar o Senhor, e estar atentos aos meios pelos quais Ele normalmente se revela e nos manifesta a Sua vontade: a Palavra de Deus, a Liturgia, os acontecimentos da vida, sobretudo os relacionados com o sofrimento dos nossos irmãos.
Este ano está particularmente marcado por uma atenção particular à Palavra de Deus: um Sínodo sobre a Palavra, o Ano Paulino. As minhas Catequeses Quaresmais serão, este ano, sobre a Palavra de Deus. Lembro-vos aqui os temas, já anunciados:
1º Domingo: O Verbo eterno e o silêncio de Deus
2º Domingo: O Verbo eterno de Deus encarna na palavra humana: carisma profético
3º Domingo: A Fé e a escuta da Palavra de Deus
4º Domingo: A Escritura e a Igreja
5º Domingo: A Palavra rezada
Domingo de Ramos: Em Cristo o Logos eterno e a palavra profética coincidem
Lembro que a Palavra da Escritura e a Palavra da Igreja são apenas meios, de certo modo sacramentais, que nos podem levar à escuta da Palavra do Deus vivo, o seu Verbo eterno. A falta da conversão do coração e a dispersão do momento podem impedir que a Palavra escutada ou proclamada não nos leve a escutar, na intimidade, a Palavra viva de Deus. Esta é sempre uma descoberta e uma surpresa, que nos mobiliza de novo para vivermos com Deus, em comunhão com Ele.
A Liturgia, a oração pessoal, a partilha fraterna, o empenho na evangelização, são circunstâncias que proporcionam uma nova escuta da Palavra de Deus. A fé é o quadro de todo este processo da escuta da Palavra de Deus. Como diz São Paulo, a salvação é um caminho que vai da fé à fé (cf. Rom. 1,16). Ela acompanhar-nos-á até ao limiar da eternidade, e inclui desde já a vivência da caridade e da esperança, atitudes constitutivas de um caminho de salvação. Como expressões da fé, elas são ainda “as primícias” de uma plenitude definitiva.
A Caridade
4. Já vimos que a fé é, em si mesma, uma expressão da caridade enquanto acto de adoração e de louvor de Deus. Amar a Deus sobre todas as coisas e cada vez melhor, será exigência contínua da fé. Não há autêntica vida de fé sem adoração e louvor a Deus.
Mas a partir do amor de Deus, a fé abre-nos para o amor dos irmãos. Viver em Igreja é desafio de viver, com os irmãos, em comunhão de amor. Não se pode, com verdade, amar a Deus que não se vê, se não amarmos os irmãos que vemos e que Deus ama.
O Santo Padre convida-nos, nesta Quaresma, a concretizar este amor fraterno na “esmola” como partilha do que temos e somos. A “esmola” de quem pode partilhar, supõe a pobreza do coração para saber partilhar. Dar aos pobres só é expressão da caridade se tivermos “um coração de pobre”.
A nossa Diocese continuará a partilhar, através da “Renúncia Quaresmal”, com as Igrejas pobres que batem à nossa porta. Em documento anexo informamos a Diocese dos pedidos atendidos durante o ano de 2007. Outros vão chegando e começam a ser analisados.
Não os conhecemos, mas continuaremos a partilhar. O dar a quem não se conhece é expressão do silêncio que o Senhor aconselha a quem dá. Desses irmãos longínquos e desconhecidos, não estamos à espera de nada em troca. Mas isto não nos dispensa de estarmos atentos aos irmãos que vivem a nosso lado.
A Esperança
5. O Santo Padre Bento XVI, na sua recente Encíclica “Spe Salvi”, mostrou-nos bem que a fé inclui a esperança, citando a Carta aos Hebreus: “A fé é a garantia dos bens que se esperam e a prova das realidades que não se vêem” (Heb. 11,1). A fé leva-nos a experimentar a comunhão com Deus e a perceber que só em Deus pode estar o nosso futuro. Aquilo que experimentamos é aquilo que esperamos em plenitude.
A fé purifica os nossos desejos, de vida, de felicidade, arranca-os ao horizonte fechado das coisas terrestres. Quando sentimos que o nosso futuro só pode estar na comunhão com Deus, alargamos o horizonte dos nossos desejos para além deste mundo, para a vida eterna.
A Quaresma é tempo de análise da nossa esperança. Não estará o nosso coração demasiadamente fixado nos bens deste mundo? Acreditamos e desejamos a vida eterna? Só assim poderemos celebrar a Páscoa como a festa da vida, o abrir definitivo do horizonte da verdadeira esperança. A esperança limitada aos horizontes deste mundo não responde aos mais profundos anseios do coração humano. Se esperamos apenas os bens deste mundo não valia a pena Cristo ressuscitar e de nos ressuscitar com Ele.
Lisboa, 2 de Fevereiro de 2008, Festa da Apresentação do Senhor.

† JOSÉ, Cardeal-Patriarca
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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Vila Real prepara recepção solene de D. Amândio Tomás




No dia 10 de Fevereiro, primeiro Domingo de Quaresma, às 15.30 horas, vai ocorrer a recepção solene do novo Bispo Coadjutor de Vila Real, D. Amândio José Tomás. Da capela do antigo Hospital da Misericórdia, sairá o cortejo litúrgico, para a Sé Catedral. A convite do Bispo Titular, D. Joaquim Gonçalves que, por razões de saúde, não poderá estar presente na cerimónia, presidirá à celebração o Arcebispo de Braga e Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Jorge Ferreira Ortiga.O novo Bispo nasceu em Cimo de Vila da Castanheira (Chaves), em 23 de Abril de1943, filho de João dos Reis Tomás (já falecido) e de Esperança Maria Tomás, sendo o mais velho de uma família de cinco irmãos. De 1955 a 1967, frequentou e concluiu os estudos de Humanidades, Filosofia e Teologia, no Seminário Diocesano de Vila Real. Foi ordenado Presbítero, em 1967. Prosseguiu os estudos teológicos na Universidade Gregoriana, aí obtendo, dois anos depois, a licenciatura em Teologia Dogmática. Regressado a Portugal, leccionou Teologia no Seminário de Lamego, foi Director Espiritual do Seminário de Vila Real e professor de Moral, no Liceu Camilo Castelo Branco. Também leccionou Teologia, no Seminário Maior do Porto e ICHT (Instituto de Ciências Humanas e Teológicas), de 1971-1976. Regressado a Roma, para frequentar o Pontifício Instituto Bíblico, licenciou-se em Ciências Bíblicas, em 1980, ano em que foi nomeado Vice-Reitor do Colégio Pontifício Português, passando a Reitor, em 1982, cargo que exerceu, até 2001.Em Outubro de 2001, foi eleito Bispo Auxiliar de Évora, sendo ordenado na festa da Epifania do ano 2002, na Basílica de S. Pedro, pelo Papa João Paulo II. Em 8 de Janeiro de 2008, foi nomeado Bispo Coadjutor da Diocese de Vila Real.
A Voz de Trás-Os-Montes 01/02/2008